Sou daqueles que sentem falta da galha sobre o poção do riacho para pular, embora já esteja grandinho, maior de sessenta, vivendo a última adolescência possível, a da chegada na envelhescência. Do pangaré para tocar vaca, do paiol, do pilão, do chão batido, da tramela, da cangalha, do pegado no tacho, do sabão caseiro, do vira-lata de nome Alto Mar, até da palmatória, de tudo sinto saudade, mas não sou abestado suficientemente para dizer, com nostalgia, que naquele tempo era melhor. O mundo sempre terá o seu lado bom e o seu lado ruim em todas as épocas, já dizia seu Elpídio Rodrigues da Costa com sua boa filosofia sertaneja.
Longe de querer ser um inteligentão, todavia papo-cabeça sempre me atraiu… e muito! Sobre disco voador? Nossa! Chego a viajar com a imaginação, sabendo que este tipo de resenha, para céticos, é coisa de lunático. Mas Fermi, um renomado físico italiano, ganhador do Prêmio Nobel, deu um bom respaldo aos malucos – e eu sou mais um – ao apresentar seu famoso paradoxo, que agora dizem que nem dele é, o qual assim reza: “Há uma aparente contradição entre altas estimativas de probabilidade de existência de civilizações extraterrestres e a falta de evidência delas e de contato com elas.” Ou seja: Com tantos mundos, é sacanagem estarmos sozinhos mas, até agora, não achamos companhia.
O mundo é mais misterioso e interessante, talvez, para os que acreditam na existência do Saci Pererê, da Mula Sem Cabeça, do Negro D’agua, do Minhocão, que a terra é plana e em disco voador.
Quantas e quantas noites o Jales Aguiar, meu mano, passou acampado no morro mais alto da fazenda, sozinho, com um telescópio no tripé, buscando ansiosamente um contato de quarto grau com homenzinhos verdes, vindos lá de Marte ou de outro planeta? “Qualquer noite destas uma onça lombo-preto vai comer este menino”, dizia o nosso pai com certa gravidade. “Onça que come égua, come gente e elas já comeram duas éguas e um cavalo no pé daquele morro,” observava.
Abordei o maninho há pouco com uma notícia animadora:
– Bicho, há um professor espanhol, o dr. Piedro Cantrera, aposentado pela USP, que me ligou… Está querendo contato com você, para os dois se deslocarem até a aldeia Funil dos indígenas da etnia Xerente. Ele soube de aparições por lá, com regularidade, o que é raro e, como um estudioso independente, localizou você, um aficcionado, e o quer como colaborador nessa jornada para irem “in loco” – palavras dele – investigar, coletar dados e mostrar ao mundo, com provas materiais e documentais, a existência de vida extraterrestre inteligente e que eles estão entre nós. Com ele você vai fazer o que gosta e ganhar o da cachaça.
Jales, pensativo, deduziu:
– Que vexame! Nós, os ditos civilizados, fomos relegados! Bem feito! Somos uma civilização com valores de merda. Não paramos jamais com as guerras. Tá vendo? Preferem contato com os indígenas, uma gente que ainda guarda certa pureza, que não destrói o meio ambiente! Puts! Como é que ele me achou? Depois da internet, ninguém tem anonimato. Vivemos um big brother universal. Ele é famoso! A NASA e a Agência Espacial Européia patrocinam suas pesquisas.
Agora eu me lembro! Ouvi uma palestra dele num congresso de ufologia em 1986. Possivelmente pegou o meu nome e endereço na lista de inscritos. Viu que Miracema do Tocantins-TO está a quarenta minutos da aldeia Funil. Com seu senso prático concluiu que um estudioso, como eu, aqui da região, facilitaria o seu trânsito por estas bandas. Foi isso!
– Ele chega aqui amanhã. Marquei para nos procurar no teu endereço às dezessete horas mas, se eu não chegar na hora, pode ir conduzindo a conversa com o mestre, porém vê se fica sem beber hoje e amanhã. Vai cortar esse cabelo, manda aparar a barba e esses fios que saem do nariz e dos ouvidos. Tente relaxar esse semblante de doidão – ou não – pois quem procura disco voador, é natural que tenha semblante esquisito e isso vai impressioná-lo positivamente.
– Irmão! Vá se f*der com os teus conselhos de merda! Amanhã, bem cedo, detalhamos nossa estratégia de contato junto com o dr. Crantera. Minha intuição me diz que não teremos problemas. São alienígenas do bem! Se tivessem abduzido um indígena, a BBC e o Estadão já teriam alardeado.
No outro dia, Jales, empolgado com tamanha oportunidade, já se imaginando a visitar outros mundos em naves com tecnologias nunca vistas na terra, capazes de quase alcançar a velocidade da luz e ele, dentro, todo protegido para não virar vapor, explorando novos mundos. Empolgado, passou o dia na bebedeira, num boteco perto de sua casa, sequer se reuniu comigo.
Por volta das dezesseis horas um emissário bem orientado foi ao botequim e alertou:
– Senhor Jales, o professor chegou. Está na sua residência.
Jales, trôpego, tentando passos firmes, dirigiu-se para sua casa e ao entrar perguntou:
– Cadê o dr. Pietro Crantera?
Uma moça, com ar de secretária, que Jales nunca tinha visto, respondeu-lhe:
-Ele está neste quarto aqui da frente, Ó! Pediu para não ser importunado. Está meditando. Quando terminar, vai dar três batidas na porta. Aí você entra e dialoga com o mestre.
Do quarto, o professor ouviu toda a conversa e começou a dar grunhidos, não tão estranhos, visto que lembravam um leitão querendo mamar. Ora grunhia, ora silenciava. Jales, do lado de fora, comentou com a secretária:
– Caraca, véi! Que cara evoluido!
Acho que é medium! Tá sendo, possivelmente, instruído por entidades antes de se encontrar com os tripulantes da nave. Pode, também, por telepatia, já estar fazendo contato, nunca se sabe…
Dois minutos depois, a senha: três toques foram dados. Jales, então, abriu a porta e entrou. Olhou para a cama e nela estava sentado um senhor com a cabeça coberta com um lençol branco e um cheiro de incenso impregnava o ambiente. Jales, sem vacilar, tomou a iniciativa:
– Buenas tardes, maestro!
O professor levantou-se, jogou o lençol para trás, mostrando sua cara para Jales. Era eu, com performance de ator de novela mexicana, fazendo o papel do professor fissurado por discos voadores, a surpreender um Jales que, extremamente desapontado, bradou:
– Você me pegou seu filho da puta!
JOSÉ EPIFANIO PARENTE AGUIAR
Sou um Baby Boomer, portanto um véi esquisito para as gerações X, Y, Z e um monstrengo para a geração Alfa.
+++++++