Decisão tem como base agravamento das irregularidades a partir de violações, falsas promessas, ameaças e cooptações aos indígenas. A decisão, publicada n último dia 16/11 está disponível no rodapé desta matéria
A Justiça Federal no Amazonas atendeu ao pedido emergencial do Ministério Público Federal (MPF), ao pedido emergencial da Organização de lideranças indígenas Mura de Careiro da Várzea (OLIMCV) e da comunidade indígena do Lago do Soares, em Autazes (AM), e suspendeu imediatamente o procedimento de licenciamento ambiental, a consulta realizada de forma irregular e qualquer avanço nos trâmites para a implantação do empreendimento da empresa Potássio do Brasil em Autazes. A decisão tem como base o agravamento das irregularidades, a partir de uma série de violações, falsas promessas, ameaças e cooptações dos povos indígenas, inclusive de lideranças Mura, e de servidores/gestores públicos por prepostos e pelo próprio presidente da empresa Potássio do Brasil.
Segundo a decisão, a continuidade do processo de implantação do empreendimento minerário com diversas irregularidades pode resultar em riscos de conflitos e mortes para o povo Mura que vive na região. Dessa forma, também foi determinada a imediata retirada do marco irregularmente afixado no território indígena, na comunidade Soares, e fixada multa de R$ 500 mil por dia de descumprimento e por violações ao território e ao povo Mura.
A empresa de mineração também foi multada em R$ 1 milhão pelo descumprimento dos deveres assumidos durante as audiências de conciliação, em especial, por realizar pressão indevida sobre o povo Mura. A Justiça Federal ainda determinou a imediata suspensão de qualquer atitude de coação, manipulação, fraude, intimidação, ameaça, pressão e cooptação contra os indígenas Mura, praticados pela Potássio do Brasil. E ainda foi fixada multa de R$ 100 mil por dia de descumprimento.
Irregularidades – Na petição feita nessa quarta-feira (15), o MPF destaca as graves violações e irregularidades em andamento. Segundo o documento, diversos relatos de áudio, vídeo, ligações telefônicas, oitivas presenciais e videoconferência, documentos e outros meios demonstram “o cenário caótico estabelecido entre o povo Mura e lideranças indígenas nas aldeias a partir de cooptações, promessas, pressões e ameaças estimuladas ou perpetradas diretamente pela empresa Potássio do Brasil e seus prepostos”.
De acordo com os procuradores da República que assinam a ação, além disso, as violações contra o provo Mura incluem compras irregulares de terrenos na região – inclusive registradas em inspeção judicial em 2022 –, intimidação via forças policiais locais, introdução de placas da empresa no território Mura de forma irregular. Os procuradores destacam que tal situação já foi objeto de pedidos recentes do MPF para aplicação de multas e adoção de medidas judiciais contra a empresa.
O MPF aponta, ainda, violações ao protocolo de consulta do povo Mura, que cita expressamente situações que podem inviabilizar e invalidar qualquer processo de consulta ao referido povo. O documento traz, por exemplo, o rito de consulta e determina que nada deve ser decidido sem amplo debate prévio com todos os Mura das aldeias, em seguida, em reuniões regionais, e depois, em reunião geral.
O protocolo também determina que não pode haver a presença dos não indígenas em reuniões internas do povo Mura. No entanto, a partir dos relatos recebidos pelo MPF, o presidente da Potássio do Brasil participou de reuniões realizadas em setembro, com inúmeras promessas e até insinuações para enfraquecimento da luta do povo Mura pela demarcação de seu território.
A petição dos indígenas Mura (OLIMCV e comunidade Soares) também acatada pela Justiça Federal, reforça o entendimento exposto pelo MPF, além de demonstrar a série de manipulações, pressões e violações, inclusive esclarece as falsas informações trazidas a público no sentido de que os indígenas Mura já teriam aprovado o empreendimento. Essas informações foram anunciadas inicialmente em reunião realizada em 25 de setembro entre algumas lideranças Mura e o governador do Estado do Amazonas.
Histórico do caso – O MPF passou a acompanhar o caso depois de receber informações de que a empresa Potássio do Brasil começou a realizar estudos e procedimentos na região sem qualquer consulta às comunidades. O órgão busca garantir o reconhecimento formal do território habitado tradicionalmente há cerca de 200 anos pelos indígenas.
Em julho de 2016, o órgão expediu recomendação ao Instituto de Proteção Ambiental do Amazonas (Ipaam), para que cancelasse a licença já expedida, e à Potássio do Brasil, para que suspendesse as atividades de pesquisa na região até a realização das consultas nos moldes previstos na legislação. Nenhum dos pedidos foi atendido.
Durante inspeção judicial realizada em 2022, o MPF colheu relatos de coação a moradores indígenas e não indígenas da região por pessoas ligadas à empresa para forçar a “venda” desses territórios tradicionais. Tais pressões, segundo relatos dos moradores, geraram insegurança alimentar pelo impedimento de acesso aos roçados tradicionais e a áreas de caça e pesca em pleno período de pandemia. Em maio deste ano, durante entrevista coletiva realizada na sede do MPF, lideranças indígenas Mura relataram que são espalhadas informações falsas sobre supostas desapropriações na região, o que tem gerado conflitos e ameaças entre os comunitários.
Em setembro, a Justiça Federal do Amazonas acatou pedido do MPF e determinou a suspensão da licença concedida pelo Instituto de Proteção Ambiental do Amazonas à empresa Potássio do Brasil para exploração mineral no território indígena Mura, em Autazes (a 113 quilômetros de Manaus). A decisão destacou que a atividade não pode ser realizada sem autorização do Congresso Nacional e posterior consulta aos povos indígenas afetados.
Tal decisão de setembro da Justiça Federal no Amazonas foi suspensa pela Presidência do TRF1, com entendimento de que o órgão competente seria o Ipaam, mas já há recurso do MPF ao pleno do TRF1, pois no entendimento do MPF, a decisão da Presidência do TRF1 viola a Constituição Federal, a Convenção 169 da OIT e dispositivos legais, além do entendimento do próprio Tribunal.
Agora novamente, em razão dos novos fatos, do grave cenário no local, gerando até mesmo risco de conflitos e morte ao povo Mura, a Justiça Federal no Amazonas suspende o andamento do licenciamento, com aplicação de multas à empresa Potássio do Brasil e outras medidas.
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